Tenho me interessado muito por retórica, desde o nascimento da filosofia por oposição a ela, e suas relações com a democracia e com a filosofia. O ponto de partida dessa discussão encontra-se no Górgias, onde Platão usa a arte retórica para desacreditar por milênios os sofistas que ensinavam em Atenas, colocando no mesmo saco pensadores que, muitas vezes, não tinham a menor relação teórica entre si. Alguns dos sofistas eram, ao contrário de Platão, defensores da democracia de Atenas, do qual, talvez, o exemplo mais ilustre é o de Protágoras. Para quem não o conhece, vale a pena dar uma olhada no Epimeteu - o mito da Criação do Homem, que está no diálogo Protágoras de Platão. É verdade que Trasímaco, outro célebre sofista retrato por Platão no Livro I da República, defendia a justiça como interesse do mais forte, mas o seu discípulo Lísias, filho de Céfalo - também personagem do Livro I da República, se ofereceu para fazer a defesa de Sócrates frente a Assembléia de Atenas. Sócrates recusa, por coerência filosófica, que um sofista fizesse a sua defesa, uma vez que o seu objetivo não era demonstrar a verdade para platéia, mas sim convencê-la por meios ludibriosos. Seja como for, Lísias teria conseguido mais do os 221 votos conseguidos por Sócrates, que ironiza a Assembléia ao se dizer surpreso com a votação pró que ele conseguiu perseguindo a verdade.
Aristóteles resgata a arte necessária à democracia em sua Retórica e, tal como aconteceu com a lógica, foi grande referência da área durante milênios. A lógica é superada somente no século XIX, de modo que Kant chegou a afirmar que o conhecimento nessa área não havia avançado um passo desde a sua sistematização por Aristóteles. A retórica, por sua vez, encontra uma ampliação e sistematização somente no século XX com o Tratado da Argumentação de Perelman. Neste, a idéia de auditório é ampliada, abstraindo das condições, digamos assim, empíricas, dos auditórios particulares e se preocupando com as técnicas retóricas tanto para a argumentação lógica, quanto para a argumentação quasi-lógica, onde metáforas, exemplos, analogias, etc. são recursos utilizados pelo orador em assuntos onde a certeza não é possível, onde o provável ou o verossímil são os únicos critérios possíveis de serem utilizados na persuasão racional.
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