A discussão abaixo também oriunda do Dadaseyn é a continuação do debate sobre lógica informal:
Com respeito à discussão original - a lógica informal - gostaria de insistir em dois pontos que creio serem fundamentais e constituem-se como tarefas extra-muros da atividade filosófica, que, muito embora no Brasil seja uma atividade quase que estritamente acadêmica, encontra importantes aplicações práticas no debate público.
O primeiro é que, dado o estado-das-artes de nossa cultura pública e cívica, o ensino de conceitos fundamentais para a construção e análise de argumentos tem não apenas aspectos lógicos e epistemológicos, como também um aspecto moral interessantíssimo. Quem quiser um bom exemplo desse aspecto, vale a pena dar uma olhada na análise já referida em post anterior que o César fez de artigo e de editorial do pasquim local. Como já referi outras vezes, a principal denúncia moral de Sócrates contra os Sofistas era, justamente, que sofismavam, ou seja, faziam mau uso das técnicas argumentativas e persuasivas para obterem vantagem pessoal e ludibriarem os incautos. Qualquer semelhança com o uso da palavra que nossos políticos e veículos de comunicação, a grande mídia, fazem atualmente - sofismando loucamente - não é mera coincidência. Nesse sentido, tenho insistido sobre a importância da lógica informal como ferramenta para qualificação, não apenas do discurso científico, como, sobretudo, do discurso corrente no debate público. Como bem notou o César em uma de nossas conversas referindo-se ao Ética Prática de Peter Singer, a exigência da coerência é a primeira das exigências morais. Sem ela não é possível alcançar a verdade, seja ela qual for.
O Eros trouxe uma grata novidade, pelo menos para mim, ao enviar o artigo do Walton sobre o Araucaria. Tenho usado o seu Lógica Informal como livro texto para minhas aulas de lógica por, justamente, permitir uma análise frutífera dos principais contextos argumentativos e das exigências lógicas presentes em cada um deles, que permite distinguir de maneira não técnica bons e maus argumentos. Por exemplo, em contextos de discurso que envolvem o debate forense (cada parte tenta convencer o juri, de modo a obter uma vitória verbal) ou a barganha (cada parte tenta obter o maior ganho possível), o uso de alguns argumentos falaciosos é tolerado. Adicionalmente, como nota Walton, ser um argumento formalmente válido não o impede de ser falacioso. Vejam essa citação do Lógica Informal tirado do valoroso portal de filosofia em língua portuguesa Crítica na Rede:
Algumas falácias são argumentos formalmente válidos, como é o caso da petição de princípio e do falso dilema: «Ou está muito frio ou está muito calor; não está muito frio; logo, está muito calor». tem uma forma válida mas é falacioso porque a primeira premissa não esgota todas as possibilidades: é falsa. Assim, apesar de ser habitual definir falácia como um argumento inválido que parece válido, a definição correcta é «um argumento mau que parece bom» — sendo que um argumento pode ser mau por outros motivos além da invalidade (nomeadamente, por não ser sólido, como é o caso do falso dilema). p.460.
Finalmente, o segundo ponto, diz respeito ao ensino de filosofia em geral e da lógica informal em particular para alunos que não serão futuros filósofos, mas advogados, jornalistas, economistas etc, os "formadores de opinião". O ensino da lógica informal constitui um imenso, significativo e inexplorado filão, que desperta o interesse e atenção de um grande número de profissões que trabalham com a palavra escrita e não encontram nos bancos escolares - em nenhum nível - um estudo introdutório sobre o uso correto de técnicas argumentativas e, especialmente, as exigências da coerência na argumentação. Muito embora seja verdade que as aulas de português, em seus níveis mais avançados tratem desses assuntos, a tarefa de destrinchar argumentos e analisar suas condições de validade é uma tarefa própria e inescapavelmente filosófica (Uma boa dica de um livro de português que toca nessas questões é o Comunicação em Prosa Moderna do Othon Garcia).
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